domingo, 29 de junho de 2014

5ª Postagem: O Mal da Vaca Louca

Atualmente, sabe-se que os príons são os agentes causais de algumas doenças transmissíveis, hereditárias ou espontâneas. Além disso, os príons possuem a capacidade de multiplicar-se de forma incrivelmente rápida, simplesmente induzindo uma mudança na forma das proteínas normais, convertendo-as em proteínas patogênicas.
Entre essas doenças, trataremos essa semana da Encelopatia Espongiforme Bovina, popularmente conhecida como Mal da Vaca Louca. Possivelmente, essa seja a área de conhecimento da população em geral sobre os príons, devido à constante recorrência dessa doença nas mídias mundiais, principalmente durante os anos 80 e 90 quando tivemos um surto de tal doença em fazendas na Europa.
A origem da EEB ainda é incerta, sendo a explicação aceita atualmente é de que seja uma variante da doença scrapie(futuramente abordada nesse blog). Devido ao quase nenhum conhecimento dos fazendeiros sobre príons na época, foi-se utilizado ração contaminada com o PrPSc causador da scrapie em vacas saudáveis, fator que levou ao surgimento da doença.
Mas, naquela época, o agente causador ainda era incerto. Vale lembrar que a EEB surgiu pouco depois do ínicio das pesquisas sobre príons e sobre a doença Scrapie. Nesse contexto, forma criadas três hipotéses sobre o agente infectante:

  1. Um vírus não identificado ou uma partícula semelhante à um vírus: embora o tamanho do agente coincida, a resistência ao calor e às substâncias químicas, bem como a ausência de quaisquer ácidos nucleicos, o diferencia de quaisquer vírus conehcido
  2. Uma bactéria móvel(Spiroplasma): muitas das características das infecções por esse tipo de bactéria são similares ao EEB, mas não existem evidências diretas para vinculá-la ao EEB
  3. Uma proteína anormal(Príon): príons alterados são encontrados ao redor de todo o cérebro de vacas contaminadas por EEB, assim como em casos da doença Scrapie.A proteína é menor que um vírus e não é modificada por calor ou desinfetantes. Esta é a teoria mais aceita pela mídia, mas vai contra muitas teorias da biologia
Com o surgimento da EEB, é importante ressaltar que a doença pode ser transmitida pelos bovinos através da alimentação de ração contaminada, do contato de outros animais da mesma espécie com regiões que entraram em contato com a placenta infectada de um bovino após o parto, da ingestão de placenta contaminada do contato com instrumentos que entraram em contato com tecido nervoso doente. Também existe a propagação vertical, que ocorre através da passagem da mãe para a prole.

No entanto, como a EEB atua no bovino?
A atuação do príon contaminado é muito parecida entre seres humanos e bovinos. Após a absorção do príon para a corrente sanguínea e passagem para o tecido nervoso, ele entra em contato com um príon normal e alerta seu formato, destruindo sua função original. Esse processo ocorre continuamente, até que os lisossomos atuam no combate ao agente infeccioso. No entanto, os lisossomos não conseguem destruir príons infectados, que ficam armazenado nos lisossomos e passam a obstruir a célula nervosa, causando sua morte e consequente liberação dos príons infectados para outras células
No local onde as células morrem, ocorre o aparecimento de "buracos" parecidos com o de uma esponja, daí a existência do Epongiforme e da principal característica de uma doença priônica, fato que levou a consideração do agente infectante da EEB ser um príon.
As consequências da contaminação também são parecidas. Na maioria dos casos, tudo inicia com a apresentação de um comportamento estranho pelo ser vivo infectado. No caso de bovinos, a principal característica é o descontrole motor devido aos danos em regiões responsáveis pela motricidade, encontradas nas regiões ventrais da medula espinhal e e do encéfalo, fazendo com que o animal agir como se estivesse enlouquecido, daí o nome Vaca Louca. No caso dos seres humanos, a doença evolui para problemas psiquiátricos(paranoia), prolemas de coordenação muscular, dificultando a fala e o equilíbrio do doente, espasmos musculares, problemas nos sentidos, coma  e, por último, o óbito.
Deve-se ressaltar que, atualmente, não existem provas disponíveis para o diagnóstico da doença em animais vivos que sejam validadas internacionalmente. O diagnóstico ocorre no momento em que o animal exibe sintomas, nas quais exames de líquido céfalo-raquidiano, ressonância magnética e tomografia computadorizada vão resultar no diagnóstico final. Em casos extremos, ocorre a biópsia cerebral, considerada muito invasiva pela abertura do crânio.
A falta, também, de um tratamento leva os países a terem medidas sanitárias consistentes quanto à importação de carne bovina, principalmente em relação aos países europeus, onde tivemos o maior surto, que resultou na morte de inúmeros animais. No Brasil, por exemplo, é proibida o uso de proteína animal em rações, mas países como os Estados Unidos aplicam regras mais severas, como a proibição da importação de ruminantes vivos ou produtos feitos de ruminantes oriundos da Europa.

Fonte:
http://saude.hsw.uol.com.br/doenca-da-vaca-louca.htm
http://www.coladaweb.com/doencas/mal-da-vaca-louca
http://www.anvisa.gov.br/faqdinamica/index.asp?Secao=Usuario&usersecoes=47&userassunto=128







domingo, 15 de junho de 2014

4ª Postagem: A dualidade dos príons

   "Os príons representam, atualmente, um campo de estudo ainda indecifrado". Através dessa constatação, iniciaremos a postagem da semana. É fato que sabe-se muito pouco sobre a realidades dos príons, tanto que muitas das doenças causadas pelos mesmos ainda não possuem cura. No entanto, ao pensar nesse tópico, cometemos um erro comum: todos acreditam que a única função dos príons é transmitir doenças. Eis que chegamos em um impasse: porque continuamos a produzir príons, se são apenas maléficos ao nosso organismo?. "Você acredita que Deus criou os príons só para matar?" Esse foi o questionamento feito por Eric Kandel, Premio Nobel de Fisiologia/Medicina de 2000.
   De fato, Kandel não estava errado em sua afirmação. Na natureza, nada é gratuito e os príons não são exceção.
   O fato desconhecido pela população é a existência de duas formas dos príons: a não causadora de doenças, que convencionaremos como PrPc, e a forma patogênica, que chamaremos de PrPSc. Em nossos organismo, as duas formas são produzidas; no entanto, para produzirmos a forma infecciosa, é necessário que o corpo sofra uma mutação, caracterizando a transmissão hereditária de príons causadores de doenças. A outra forma(assunto abordado em nossa segunda postagem) seria através da ingestão de alimentos com o PrPSc, tal como as carnes acometidas pelo Mal da Vaca Louca.
   A diferença entre os dois tipos de príons encontra-se em sua estrutura secundária. Na realidade, os PrPc possuem cadeia alfa, em forma de hélice; enquanto os PrPSc possuem cadeia beta, na forma de uma fita esticada. Nos dois casos, temos uma estrutura mantida pelas pontes de hidrogênio entre as cadeias não-laterais, ou seja, entre os grupos -NH e -C=O. A diferença entre as duas está na distância dos segmentos da cadeia, pois, no caso da alfa, encontram-se ligações entre segmentos mais próximos que no caso da beta, fator que justifica sua conformação.
   Outro fator interessante é a capacidade de contágio do PrPSc, capaz de alterar a composição estrutural do príon não-contagiante. Dessa maneira, um contágio de uma doença torna-se mais eficaz, pois, ao haver o contágio, os príons saudáveis do organismo que fora infectado irão alterar-se e tornarão-se infectantes.

   Mas qual é o verdadeiro papel dos príons em nosso organismo?

   A função essencial dos PrPc é estabilizar as sinapses que formam memórias de longo prazo. Isso, pois sem essas sinapses, nunca poderíamos formar tais tipos de memórias, já que os processos celulares necessários para formar a memória são concluídos e, após cerca de dois meses, desaparecem. No entanto, ao realizarmos tais sinapses, podemos manter a formação de novas moléculas como substituta das antigas em uma reação em cadeia.
   Existem outras funções que os príons são responsáveis, tal como organizar e controlar a passagem de informações do meio externo para o interno. Isso, pois o príon atraí determinadas proteínas do meio extracelular e repassa suas informações para o meio intracelular. Concomitantemente, novas pesquisas demonstram que os PrPc têm papel importante no amadurecimento e na formação do prolongamento de neurônios, além de protegê-las da apoptose, ou morte celular programada(vale ressaltar que novos neurônios não são formados, caso haja a morte de um), além de modular a resposta do sistema imunológico às inflamações.
   A forma patogênica também pode ser utilizada em prol da saúde. Isso, pois foi comprovada a ação do PrpSc em modular a agressividade em células tumorais, podendo, até mesmo, ser uma nova forma de combate ao câncer.

Fonte:
http://agencia.fapesp.br/10516
http://www.bv.fapesp.br/7934
http://www2.uol.com.br/sciam/noticias/prions_sao_cruciais_para_preservar_memorias_de_longo_prazo.html
http://aprendabiologiacomdjalminha.blogspot.com.br/2009/04/prions.html

quarta-feira, 4 de junho de 2014

3ª Postagem: O "sonho" do estudante de medicina

   Todo estudante de medicina, mesmo durante sua época de vestibulando, deseja uma capacidade que vai contra suas necessidades fisiológicas primárias: a capacidade de não dormir. Seria incrível conseguir passar 24 horas acordado, não seria? Em nossa terceira postagem sobre as moléculas proteicas que possuem propriedades infectantes, vamos tratar sobre uma doença rara e, no minimo, agonizante conhecida como Insonia Familiar Fatal.
   O primeiro caso confirmado de Insonia Familiar Fatal ocorreu em 1986. No entanto, a história dessa doença tem origem mais antiga. A pesquisa inciou-se com uma família, em 1973, em que duas irmãs e um irmão apresentavam distúrbios neurológicos sem haver um consenso entre os médicos sobre a verdadeira doença, mesmo que muitos falassem de Mal de Alzheimer. Os sintomas eram os mesmos, inciando com ansiedade e depressão, depois o sonambulismo e, após certo tempo, entrada em uma espécie de torpor e deficiência das funções vitais, tais como: transpirar continuamente e comer com voracidade. Logo após certo tempo, a primeira irmã faleceu e estudos de seu cérebro apresentaram apenas uma pequena lesão no tálamo.
    Por afetar uma geração de uma família, o médico da mesma reconstruiu a árvore genealógica e encontrou diversos casos de mortes por esgotamento que eram explicados como alcoolismo ou demência. Tais descobertas resultam na crença do primeiro caso ou paciente-zero da doença ter surgido no século XVIII de tal família. A descoberta acarretou na internação do irmão, que apresentou estado de vigília continuo em seu encefalograma, mesmo que interrompido por breves fases de sono REM. Após sua morte, o estudo do cérebro mostrou resultados idênticos aos da irmã. A questão era: como lesões no tálamo poderiam ocasionar estado de vigilância, sendo que não é essa uma função referente ao tálamo?
   Pela pesquisa ter demorado anos de estudo, descobriu-se que a lesão no tálamo não era o fator motivador da vigília, mas como essa estrutura serve de estação intermediária a diversas áreas do corpo, como o hipotálamo- responsável pela regulação do sono e da vigília em sua parte posterior ao reforçar a ação do sistema ativador reticular ascendente-, a lesão ocasionou no rompimento dessa ligação tálamo-hipotálamo.
    Os estudos dos cérebros infectados também demonstraram outro fator interessante: a semelhança das lesões com as encontradas em vítimas da doença de Creutzfeldt-Jakob, doença caracterizada pelo seu agente infeccioso serem os príons. Tais proteínas causavam destruição de células nervosas e surgimento de buracos no tecido nervoso, sendo comparado a uma esponja. Junto a isso, a inoculação de amostras do cérebros de infectados em camundongos geneticamente modificados e, por conseguinte, a evolução da doença finalizou a tese de que a IFF era causada por príons
    Por motivos desconhecidos, a doença costuma surgir apenas aos 50 anos de idade, havendo morte da vítima, no máximo, após 36 meses de IFF. A doença é considerada torturante, pois manter uma pessoa acordada durante semanas é um dos métodos de torturas que foi utilizado durante guerras.
    A doença é dividida em etapas, sendo a primeira iniciando com falta de sono, falta de atenção, irritação, paranoias, taquicardia. Nesta etapa, o doente ainda confunde a IFF com uma insônia normal, mas logo percebe que sua falta de sono não é algo passageiro. Na segunda fase, surgem as paranoias, ataques de pânico, alucinações, confusão mental. Já a terceira fase tem a rápida perda de peso como fator característico. A quarta e última fase apresenta demência, coma, perca da capacidade de responder estímulos externos e, por fim, a morte. Um detalhe importante é o fato de que remédios para dormir apenas agravam a situação do paciente, causando uma aceleração e agravamento dos sintomas.
   A boa notícia relacionada à IFF é sua forma de contágio ser apenas pela hereditariedade e apenas 30 famílias têm o gene conhecido como causador da doença. Alia-se a isso o fato de que as chances de transmissão do gene entre gerações é de 50 por cento, ou seja, não é obrigatória a transmissão.
   A notícia ruim é que não existe um tratamento conhecido para a doença. Portanto, os conhecidos como infectados podem apenas esperar a morte. Devemos lembrar que pesquisas sobre estados de sono e de vigilância não estão completos e que as pesquisas sobre príons são mínimas. No entanto, a qualidade de vida da vítimas pode ser melhorada em seus últimos dias de vida através de um tratamento de controle dos sintomas secundários.

Mas como a bioquímica atua durante o processo de vigília e sono?
   Como já foi dito, o campo de estudo do processo vigília-sono ainda não foi totalmente decifrado e possui diversos estudos. Um deles fala da importância do ácido gama-amino-butírico(GABA), o neurotransmissor mais abundante no SNC. Este tem sua atuação no hipotálamo, além do locus ceruleus e na porção anterior do cérebro. Portanto, ao não conseguir chegar em áreas de atuação, não poderá realizar sua função.
   Em relação ao hipotálamo, sabe-se existem três sub-divisões dele que comandam esse processo. Neles, encontraremos o sistema gabaérgico inibitório do núcleo pré-óptico do ventre lateral, responsável pela mantuenção do sono NREM. Encontraremos também os neurônios supraquiasmáticos que controlam o ritmo cardíaco durante o sono e os núcleos do prosencéfalo basal que ativam o processo de vigília.
  Abaixo, a imagem à esquerda explica a ligação entre o tálamo e as regiões do sistema nervoso responsáveis pelo proceso sono-vigília e a imagem à direita demonstra um dos ciclos de interação do sono



Por fim, temos um documentário que resume a IFF

Leitura recomendada: http://revistapiaui.estadao.com.br/edicao-6/questoes-medicas/dormir-nunca-mais

FONTE:
http://www.infoescola.com/doencas/insonia-familiar-fatal/
http://www2.uol.com.br/vivermente/reportagens/a_epidemia_da_insonia.html
http://www.brasilescola.com/doencas/insonia-familiar-fatal.htm
http://www.psiquiatriageral.com.br/sono/insonia.htm
http://www.scielo.br/pdf/rbp/v27s1/24474.pdf